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Formação em Agroecologia e Saúde do Solo traz importantes avanços aos camponeses da Terra do Guaraná
O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas - IFAM Campus Maués recebeu a caravana agroecológica entre os dias 28 de maio e 07 de junho de 2022, com a presença dos professores Sebastião Pinheiro e Oliver Blanco da organização “Juquira Candirú Satyagraha”. Sebastião Pinheiro, mais conhecido como “Tião”, é engenheiro agrônomo, pós-graduado em Toxicologia, Poluição Alimentar e Meio Ambiente pela Bundesanstalt für Getreide-, Kartoffel- und Fettforschung (BAGKF) na Alemanha. Foi delegado brasileiro no Codex Alimentarius das Nações Unidas em Haia e atuou no Núcleo de Economia Alternativa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) até se aposentar. É autor e coautor de diversas publicações que são referências no campo da Agroecologia, entre elas: “Agente Laranja em uma República de Banana”, “Biotecnologia: muito além da revolução verde”, “Agricultura Orgânica e Máfia dos Agrotóxicos no Brasil”, “Ladrões de natureza”, “Agropecuária sem veneno”, “MB-4 Agricultura Sustentável, trofobiose e biofertilizantes”, “Saúde no solo versus Agronegócios”, “Cartilha dos agrotóxicos”, além de traduzir obras importantes como “Panes de Piedra” de Julius Hensel e “Húmus” de Selman Waksman. Entre as obras mais recentes estão “Cartilha da regulação climática”, “O biopoder camponês” e “Agroecologia 7.0”.
Oliver é também engenheiro agrônomo, pesquisador associado na Universidade Federal do Mato Grosso, campus Sinop, além de produtor orgânico no município de São Pedro (SP), e vem realizando com “Tião” uma série de cursos voltados para agricultores, estudantes e profissionais da agricultura de base ecológica. Como ativistas científicos, ambos se dedicam a estudar as relações entre agricultura, saúde e meio ambiente com campesinos e os movimentos sociais na América Latina, com quem vêm desenvolvendo a cromatografia de Pfeiffer e outras ferramentas do “bombeiro agroecológico” para o fortalecimento da agroecologia camponesa e indígena.
As atividades da Caravana Agroecológica em Maués iniciaram no Rio Paricá, com a participação dos agricultores da Associação ASCAMPA. Nos dois dias de atividades, foram realizadas diversas práticas agroecológicas, como: “Água de vidro”, peletização de sementes com cinza de forno, calda sulfocálcica, produção de fosfito com osso calcinado e sementes de açaí, adubo de Bokashi amazônico e coleta de micorrizas nativas para recolonização dos solos de cultivo.
O grupo formado por agricultores, estudantes e profissionais da agricultura também percorreu áreas de cultivo de guaraná, o barracão de processamento do fruto, símbolo do território, sistemas agroflorestais e cultivo de banana para debater sobre os desafios da produção e o aproveitamento de recursos disponíveis na própria região. A vivência permitiu momentos intensos de trocas de experiências, trazendo à roda de aprendizagem a confluência de saberes tradicionais e estudos atualizados que, devidamente contextualizados, permitiram aos participantes aprimorar suas técnicas de cultivo e ampliar seus conhecimentos na Agroecologia e produção orgânica.
A segunda parada da caravana foi na Terra indígena Andirá-Marau, mais especificamente na comunidade Ilha Michiles, no rio Marau com a participação dos estudantes do Curso Técnico Integrado em Agroecologia do IFAM campus Maués. Na oportunidade, os professores participaram da abertura da semana de alternância de estudos com o tema gerador “A história da minha comunidade”. Na Ilha, também foram realizadas práticas agroecológicas intercaladas por discussões sobre a saúde do solo e como promover a sua fertilidade a partir da matéria orgânica. O aproveitamento do paú (material orgânico de árvores em decomposição, especialmente as palmeiras), foi um assunto amplamente explorado, integrando os conhecimentos dos indígenas ao conhecimento científico para promover uma agricultura de base ecológica.
Por meio de uma caminhada guiada, os estudantes também puderam apresentar seus “projetos de vida” que estão sendo desenvolvidos na comunidade, promovendo um rico debate sobre: o horto medicinal, o quintal agroflorestal e seu manejo sucessional, a criação sustentável de abelhas indígenas, a entomofagia (ingestão de insetos) na cultura alimentar do povo Sateré-Mawé e a horta orgânica do coletivo de mulheres indígenas Sateré-Mawé.
A equipe também fez uma parada na comunidade Ilha de Vera Cruz e ao Museu Arqueológico, onde foi possível coletar amostras de solo de Terra Preta Indígena que foram utilizadas posteriormente no curso sobre Cromatografia de Pfeiffer e saúde do solo” realizado do IFAM.
A equipe então retornou à sede do município para dar continuidade na caravana e desenvolver nas atividades de formação, com agricultores, estudantes, técnicos extensionistas, servidores do IFAM Campus Maués e comunidade externa.
O curso prático de Análise de solo e alimentos com a Cromatografia Pfeiffer iniciou com a participação de um público variado de estudantes da zona rural, urbana e da terra indígena, agricultores, técnicos, estudantes e professores. A análise consiste numa ferramenta acessível, de baixo custo, que utiliza reagentes e material de fácil aquisição, e pode ser feita no campo, em casa ou em laboratórios didáticos.
Com a cromatografia é possível coletar o solo e obter o resultado de forma imediata, o que permite o acompanhamento permanente da vida e fertilidade do solo de uma área. Por meio dessa técnica, é possível monitorar se houve a utilização de agrotóxicos, ou se as práticas adotadas nos cultivos estão gerando um efeito positivo na manutenção da saúde do solo e consequentemente na qualidade dos alimentos produzidos.
A formação em Agroecologia foi realizada em dois momentos distintos: o primeiro, no auditório do IFAM Campus Maués, tratou sobre a Agroecologia de forma ampla, abordando sobre as transformações que a agricultura e a ralação com a terra passaram até os dias de hoje, e como os camponeses são fundamentais na regulação climática e para a sobrevivência da humanidade.
O segundo momento ocorreu na Feira Agroecológica de Maués, que é realizada mensalmente, e dessa vez teve como tema “Sementes para a cura do amanhã”. Tião, Oliver e agricultores promoveram um extenso debate sobre a importância das sementes e da preservação da sociobiodiversidade. A feira contou com apresentações culturais de música regional com o grupo Pingo de Luz e Tom do Sax, animando os presentes com muito gambá, ritmo tradicional da região. Ao final, foi realizada uma roda de troca de sementes.
Os professores Tião e Oliver também participaram de um dia de campo no sítio São Luiz, propriedade da Sra. Maria do Rosário e Sr. Mamédio Barbosa, na estrada da Safrita, Km 12. Apesar da chuva, foi possível percorrer os roçados tradicionais, debater sobre os efeitos do fogo na abertura de áreas de plantio, sobre o (bio)carvão e a Terra Preta Indígena. A dupla aproveitou para fazer mais uma vez a calda sulfocálcica de forma que os participantes pudessem aproveitar o dia de aprendizados.
Tião e Oliver encerraram os trabalhos em Maués com uma palestra em alusão ao dia mundial do meio ambiente com estudantes do 8º e 9º anos das escolas Estaduais Maria da Graça Nogueira e São Pedro, com o tema “É preciso ver com os olhos de guaraná”. Os professores fizeram um apanhado histórico da pauta ambiental no mundo e no Brasil, das conferências de líderes mundiais, como a Eco 92, e sobre a importância dos camponeses para o desenvolvimento sustentável no mundo. Foram falas que combinaram muito da experiência dos palestrantes na América Latina e Europa em total contextualização com a Amazônia, o que empolgou em grande medida os presentes.
Após as diversas atividades de formação, Tião e Oliver foram recebidos no Gabinete da Direção Geral para receber uma Menção Honrosa pelos serviços prestados à comunidade mauesense e ao IFAM campus Maués. O campus avança na pauta agroecológica e se fortalece neste campo após esse intenso aprendizado e troca de experiências com profissionais de prestígio na área.
A formação foi um trabalho realizado pelo IFAM campus Maués com a participação de diversas instituições parceiras como o Instituto Piagaçu, Rede Maniva de Agroecologia (REMA), ASCAMPA e AAFAU.
Texto: Danilo de Oliveira Machado e Melissa Michelotti Veras